Pois o sujeito não
andava lá muito bem de vida, mas dava para o gasto. A cidade onde morava era
próspera e não havia crise no mercado, por isso mesmo com parcos recursos podia
sobreviver. Mas a prosperidade alheia e as aquisições de bens, fazem com que os
outros também sintam esta necessidade. Pois ele vendo seus próximos comprarem
automóvel, viu-se no direito de também ter o seu. Financiou em algumas parcelas
e saiu da revenda de carro zero. As prestações cabiam no seu orçamento. Com a
família ficando mais velha, filhos na adolescência, foram sendo avultadas as
demandas por alguns bens de melhor qualidade como roupas e despesas escolares,
festas etc. Estava empregado, o clima era de progresso e promessas de uma
promoção, arriscou-se em mais alguns financiamentos, sempre a longo prazo.
Surgiram alguns imprevistos nas finanças, como conserto do automóvel, uma
cirurgia imprevista na esposa, troca de alguns eletrodomésticos por outros mais
econômicos e/ou modernos, e assim algumas prestações foram atrasando, gerando
juros e multas. Nada que não se resolvesse com novos empréstimos a juros um
pouco maiores, já que seu fator de risco aumentou dado aos atrasos que vinha
tendo em seus compromissos. Eis que uma grande instituição financeira, prometeu-lhe
um só grande empréstimo, que saldaria todas as suas dívidas com juros que,
embora um pouco maiores alongaria suas prestações quase que “ad eternun”.
Aceitou de pronto, ainda mais que lhe sobraria bastante dinheiro e ele ficaria
livre de vários cobradores lhe fazendo pressão. Trataria com um só. As
prestações, claro, comprometiam quase todo seu orçamento, mas ele estava com
uma boa quantia de recursos e a promessa de uma boa promoção no trabalho. Todos
estavam sendo promovidos e chegaria a sua vez. Na certeza do progresso futuro,
passou inclusive a fazer doações a vizinhos e amigos que lhe eram simpáticos,
ajudaram em seus pleitos junto a clubes sociais, ficou influente na roda de
amigos, viajava a negócios, sem que ninguém soubesse que negócios eram. Quando
alguém necessitava de recursos, emprestava ou intermediava junto a alguma
entidade financeira a realização do empréstimo. A mulher, vendo que havia muita
espuma e pouco líquido no recipiente, alertou para que houvesse mudanças, ele
irritado logo se separou e casou-se com outra. Esta, ao contrário da mulher
anterior, lhe dava o maior apoio em suas investidas. Os filhos que ficaram com
a antiga mulher, ficaram inconformados em perder a boa e farta vida que
levavam, revoltados com a mãe, mas foram obrigados a ficar com ela pois a
madrasta rejeitou-os. Mas a conta chegou. Ele, abandonado pelos amigos e pela
mais nova companheira, sem a mínima capacidade de honrar seus compromissos, foi
processado e o seu incompetente defensor não impediu que lhe fosse tolhida a
liberdade. Isto não impediu a antiga esposa tivesse que arcar com várias contas
deixadas pelo irresponsável e que, para conseguir manter a sua honra,
esforçava-se em pagar. Ficou a pobre coitada com todo o ônus e as frequentes
cobrança dos filhos que reclamavam de sua pouca capacidade de manter o nível de
vida que levavam quando ainda tinham a administração do pai. Uma vida agora sem
luxo e com algumas contas para pagar, mas sendo honradas. Nada de novas
aquisições até se saldar o que se deve. E tendo que aturar os filhos a lhe
chamar de pouco sensível, desumana e causadora de toda a desgraça. Parece que
até a casa o irresponsável havia vendido. Mas ela não entregou. Qualquer
semelhança com o que estava e está ocorrendo no nosso país, não é mera
coincidência.
Afonso
Pires Faria, 13.10.2019.
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