Fazenda do cinamomo. Assim era chamada, pelo
grande número destas arvores que cercavam as casas. Hoje possivelmente, não
tenha mais nenhuma desta espécie. Os tempos mudam. A casa grande tinha as
paredes externas feitas de pedras amalgamada com uma mistura de argila e cal.
Cimento, creio que não tinha. A largura das paredes, superavam meio metro. Não
raras vezes vi a minha mãe passar roupa no beiral das janelas, tamanho era o
espaço que havia. A propriedade era do meu tio Manoel. Mas somente de fato e de
direito, porque no folclore ela pertencia ao meu pai. Todo o São Sepé sabia que
aquilo era do meu pai, e para fins de status era o que valia. E não adiantava
meu pai dizer que não era dele que ninguém acreditava. Meu tio, certa feita foi
a cidade com o meu pai e passou por um empregado seu. Quando indagado se era um
funcionário novo na fazenda, possivelmente ele passou por mentiroso quando
disse que não, que era o proprietário. Certa feita o tio chegou na fazenda
juntamente com seu filho Zeca e não encontrou nem meu pai nem minha mãe.
Almoçaram e foram embora, mas não sem anates o Zeca deixar uma mensagem da
estada na propriedade. Utilizou-se do que tinha a mão, uma cartolina que servia
para embalar camisa, e fez uns versos, que infelizmente, penso que se perderam,
mas eu ainda tenho em mente algumas partes “ vinte e três de dezembro, ante-
véspera de natal, chegamos no cinamomo, só para passar mal. Não tinha ninguém
em casa, a não ser a dona Mimosa, a velhinha esforçou-se e deu-nos uma boia bem
gostosa. Também estava o Joãozinho, com seu sorriso ardente, apiedou-se de nós
e deu-nos um mate bem quente”. Depois em outras partes, sempre em versos
rimados, reclamou que encontrou os vidros de cachaça, somente com as frutas
pois cachaça não tinha mais e que a mãe, por tamanha penúria teria ido pedir
socorro urgente na casa dos seus pais. Mas mudaram as coisas. A funcionalidade
das casas e galpão não são mais as mesmas. As atividades são outras e exigem
outras funcionalidades. O galpão, por exemplo, era assim: Uma porta grande na
entrada, ensimesmada com o nome “Fazenda do Cinamomo”, juntamente com a marca
do gado, um “S” espelhado, bifurcado em suas extremidades. À esquerda uma porta
que dava entrada para o quarto do Valmor (uma história à parte), mais afrente o
quarto das ferramentas. Lá eram guardados martelos, foice, enxó, correntes,
máquina de puxar e chave para trabalhar arame, prego, talhadeira, pá, socador e
muitos outros artefatos necessários para o trabalho de campo. Eram tantos
utensílios que o quarto, que deveria ter uns doze metros quadrados, ficava
lotado de quinquilharias. A peça grande era o galpão do fogo, este ficava bem
no centro. O fogo, dificilmente se apagava. Contíguo a ele ficava o quarto dos
arreios, lá, encilhando um cavalete, estavam, freio, rédeas, buçal, peitera,
rabicho, xergão, carona, os bastos, laços, cabresto, todos com seus apêndices
como estribos, argolas etc. A porta de saída deste recinto, ficava a quase um
metro de altura do chão, isto era proposital, para o campeiro poder com mais
facilidade fazer a encilha do cavalo. Mas como eu disse, tudo agora mudou. Se
eu chegar agora, tenho a certeza de não encontrar mais fogo feito, o quarto de
ferramentas não terá nenhum objeto que antes lá se encontrava e o dos arreios,
possivelmente no lugar dos cavaletes uma mesa e em substituição dos aperos, um
computador, com mouse, teclado, CPU, monitor e outros acessórios totalmente
inúteis para a encilha de um matungo.
Afonso Pires Faria, 02.05.2019.
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