quinta-feira, 2 de maio de 2019

FAZENDA DO CINAMOMO.


Fazenda do cinamomo. Assim era chamada, pelo grande número destas arvores que cercavam as casas. Hoje possivelmente, não tenha mais nenhuma desta espécie. Os tempos mudam. A casa grande tinha as paredes externas feitas de pedras amalgamada com uma mistura de argila e cal. Cimento, creio que não tinha. A largura das paredes, superavam meio metro. Não raras vezes vi a minha mãe passar roupa no beiral das janelas, tamanho era o espaço que havia. A propriedade era do meu tio Manoel. Mas somente de fato e de direito, porque no folclore ela pertencia ao meu pai. Todo o São Sepé sabia que aquilo era do meu pai, e para fins de status era o que valia. E não adiantava meu pai dizer que não era dele que ninguém acreditava. Meu tio, certa feita foi a cidade com o meu pai e passou por um empregado seu. Quando indagado se era um funcionário novo na fazenda, possivelmente ele passou por mentiroso quando disse que não, que era o proprietário. Certa feita o tio chegou na fazenda juntamente com seu filho Zeca e não encontrou nem meu pai nem minha mãe. Almoçaram e foram embora, mas não sem anates o Zeca deixar uma mensagem da estada na propriedade. Utilizou-se do que tinha a mão, uma cartolina que servia para embalar camisa, e fez uns versos, que infelizmente, penso que se perderam, mas eu ainda tenho em mente algumas partes “ vinte e três de dezembro, ante- véspera de natal, chegamos no cinamomo, só para passar mal. Não tinha ninguém em casa, a não ser a dona Mimosa, a velhinha esforçou-se e deu-nos uma boia bem gostosa. Também estava o Joãozinho, com seu sorriso ardente, apiedou-se de nós e deu-nos um mate bem quente”. Depois em outras partes, sempre em versos rimados, reclamou que encontrou os vidros de cachaça, somente com as frutas pois cachaça não tinha mais e que a mãe, por tamanha penúria teria ido pedir socorro urgente na casa dos seus pais. Mas mudaram as coisas. A funcionalidade das casas e galpão não são mais as mesmas. As atividades são outras e exigem outras funcionalidades. O galpão, por exemplo, era assim: Uma porta grande na entrada, ensimesmada com o nome “Fazenda do Cinamomo”, juntamente com a marca do gado, um “S” espelhado, bifurcado em suas extremidades. À esquerda uma porta que dava entrada para o quarto do Valmor (uma história à parte), mais afrente o quarto das ferramentas. Lá eram guardados martelos, foice, enxó, correntes, máquina de puxar e chave para trabalhar arame, prego, talhadeira, pá, socador e muitos outros artefatos necessários para o trabalho de campo. Eram tantos utensílios que o quarto, que deveria ter uns doze metros quadrados, ficava lotado de quinquilharias. A peça grande era o galpão do fogo, este ficava bem no centro. O fogo, dificilmente se apagava. Contíguo a ele ficava o quarto dos arreios, lá, encilhando um cavalete, estavam, freio, rédeas, buçal, peitera, rabicho, xergão, carona, os bastos, laços, cabresto, todos com seus apêndices como estribos, argolas etc. A porta de saída deste recinto, ficava a quase um metro de altura do chão, isto era proposital, para o campeiro poder com mais facilidade fazer a encilha do cavalo. Mas como eu disse, tudo agora mudou. Se eu chegar agora, tenho a certeza de não encontrar mais fogo feito, o quarto de ferramentas não terá nenhum objeto que antes lá se encontrava e o dos arreios, possivelmente no lugar dos cavaletes uma mesa e em substituição dos aperos, um computador, com mouse, teclado, CPU, monitor e outros acessórios totalmente inúteis para a encilha de um matungo.
Afonso Pires Faria, 02.05.2019.

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